Pesquisas da Universidade de São Paulo (USP) e de especialistas em ecologia revelam que espécies exóticas invasoras (EEIs) representam uma séria ameaça não só à biodiversidade brasileira, mas também à saúde pública. Essas espécies, introduzidas muitas vezes por ações humanas e comércio ilegal de animais, desequilibram ecossistemas, competem com espécies nativas e podem carregar patógenos perigosos, inclusive bactérias multirresistentes.
Ameaça invisível: bactérias resistentes
Segundo Gabriel Siqueira, doutorando da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, as EEIs podem transportar microrganismos perigosos entre regiões e espécies. Ele identificou, por exemplo, a presença de E. coli resistente em quatis e atualmente pesquisa gambás na cidade de São Paulo. Esses animais funcionam como sentinelas ambientais de contaminação por bactérias prioritárias listadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
O professor Marcos Bryan, que orienta o estudo, alerta para a ameaça silenciosa dessas espécies, como pombos e ratos, que vivem próximos ao homem, carregam patógenos e não demonstram sintomas. “Eles podem disseminar genes de resistência microbiana para humanos e animais domésticos”, afirma.
Vetor de doenças e amplificador de contaminações
O problema se agrava nas cidades, onde há contato com esgotos contaminados por efluentes hospitalares e uso indiscriminado de antibióticos. “As EEIs adquirem essas bactérias no ambiente urbano e amplificam sua presença pela rápida reprodução”, explica Bryan. Javalis, por exemplo, entraram ilegalmente pela Argentina e hoje percorrem livremente diversos estados brasileiros.

Riscos diversos: de vetores e reservatórios
A professora Michele Dechoum, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), colaboradora do Instituto Hórus e coordenadora da Base Nacional de Espécies Exóticas Invasoras, explica que essas espécies afetam a saúde humana de quatro formas:
- Como causadoras diretas de doenças, como o vírus da Influenza.
- Como vetores, como o mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue.
- Como facilitadoras indiretas, ao abrigarem parasitas humanos.
- Como reservatórios de patógenos, como caracóis, aves e mamíferos exóticos.
Comércio ilegal e spillover
Mesmo com restrições do Ibama, o comércio ilegal de répteis e anfíbios persiste. O risco aumenta com a soltura desses animais na natureza, o que pode causar o spillover, quando patógenos saltam de animais silvestres para humanos, por meio de vetores intermediários.
Mudanças climáticas e expansão geográfica
A crise climática também impulsiona o avanço das EEIs. À medida que o desmatamento avança, essas espécies adaptam-se ao ambiente urbano, substituem espécies nativas e tornam os ecossistemas mais frágeis.
Dechoum destaca a falta de dados sobre os microrganismos associados a essas espécies invasoras no Brasil. Segundo o Relatório Temático Sobre Espécies Exóticas Invasoras (2024), há mais de 500 espécies invasoras registradas no país, mas com pouco conhecimento sobre os microrganismos que transportam.
Saúde Única e ações futuras
A abordagem científica One Health (Saúde Única) é vista como essencial para compreender e combater esses riscos combinados. O Ministério da Saúde criou um grupo de trabalho para abordar a resistência antimicrobiana com foco também em invasões biológicas.
“É fundamental alinhar saúde humana, ambiental e animal para desenvolver estratégias de biossegurança mais eficazes”, conclui Siqueira.
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