Enquanto o governo trava disputas no Congresso Nacional e no STF por justiça fiscal e aumento de arrecadação, um novo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que o Brasil deixa de arrecadar mais de R$ 200 bilhões por ano por conta de brechas e distorções no sistema tributário.
Elaborado pelo economista Sérgio Wulff Gobetti, o documento intitulado “Ineficiências e Iniquidades do Imposto de Renda: Da Agenda Negligenciada para a Próxima Etapa da Reforma Tributária”, revela como regras desiguais de cobrança de tributos favorecem contribuintes de maior renda e fragilizam o princípio da progressividade — segundo o qual quem ganha mais, paga mais proporcionalmente.
O estudo contribui para o debate sobre justiça tributária enquanto tramita na Câmara um projeto de lei que isenta do IR quem ganha até R$ 5 mil e tributa altas rendas. Paralelamente, o STF analisa a validade do decreto presidencial que aumentou a alíquota do IOF, contestado pelo Congresso.
Regimes empresariais distorcem a carga tributária
Uma das principais críticas do estudo recai sobre os regimes optativos de tributação do lucro: Simples Nacional, lucro presumido e lucro real. Segundo Gobetti, a ideia inicial de simplificar a vida das pequenas empresas foi desvirtuada, criando vantagens injustificadas para empresários com alta capacidade contributiva.
“Empresas de mesmo faturamento podem ter lucros muito diferentes, e isso afeta a tributação dos sócios. Hoje, o regime favorece quem lucra mais e investe menos”, explica.
A pesquisa mostra ainda que conglomerados empresariais frequentemente distribuem custos artificialmente entre unidades para pagar menos imposto. Assim, unidades no lucro real assumem os gastos, enquanto as do lucro presumido concentram o faturamento.
Em 2019, as perdas com essas práticas foram estimadas em R$ 115,9 bilhões no lucro presumido e R$ 87,7 bilhões no Simples Nacional.
Dividendos e JCP: concentração e renúncia
Gobetti também critica a isenção de dividendos — lucros distribuídos a acionistas —, prática mantida apenas por três países no mundo, entre eles o Brasil. O autor defende que a taxação tornaria o sistema mais progressivo e permitiria até reduções de impostos para as empresas, estimulando o investimento.
O estudo propõe ainda fechar brechas como os juros sobre capital próprio (JCP), mecanismo usado para driblar a tributação dos lucros. Em 2023, o JCP representou uma perda de R$ 24 bilhões aos cofres públicos.
A pesquisa alerta para o efeito disso na concentração de renda: o 1% mais rico no Brasil passou a concentrar 24,4% da renda total, e 88% desse aumento foi capturado pelos 0,1% mais ricos.
Setor de petróleo também é alvo
O autor ainda sugere uma tributação extraordinária sobre lucros do setor de petróleo em períodos de alta de preços. Segundo Gobetti, com o Brent na casa dos US$ 70, o governo poderia arrecadar R$ 8 bilhões ao ano, chegando a R$ 40 bilhões em momentos extremos, como ocorreu em 2022.
“Não se trata de impedir lucros, mas de captar parte dos ganhos extraordinários de forma justa”, justifica.
Conclusão
Gobetti resume com um velho ditado da economia:
“Não existe almoço grátis. Alguém sempre paga a conta.”
Neste caso, diz ele, os menos favorecidos pagam pela manutenção de privilégios tributários, que comprometem não só a justiça social, como a competitividade da economia.
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