O que deveria ser o maior projeto logístico do Espírito Santo corre o risco de naufragar antes mesmo de sair do papel. O Porto Central, em Presidente Kennedy, no sul capixaba, está praticamente sepultado diante do avanço consolidado do Porto do Açu, no Norte Fluminense, que já se tornou uma referência internacional em logística portuária e suporte às atividades de petróleo e gás.
As imagens aéreas obtidas pela Agência Fonte Exclusiva revelam a realidade do empreendimento: uma pequena área de terraplanagem, sem obras de infraestrutura relevantes. A promessa de um porto de 5ª geração virou sinônimo de frustração, esbarrando em entraves ambientais, resistência da comunidade local e, sobretudo, ausência de articulação política e investimentos concretos.
Porto do Açu em plena operação
Enquanto o Porto Central patina, o Porto do Açu avança com operações que vão do transbordo de petróleo ao embarque de minério de ferro e soja para exportação. Com mais de 20 km² de área e um distrito industrial planejado para 70 km², o complexo fluminense já absorveu a demanda que antes era direcionada ao Porto de Montevidéu (Uruguai).
O especialista Hevilmar Rangel, doutor em Planejamento Regional e autor de uma dissertação sobre o Porto do Açu, afirma que o projeto capixaba se tornou inviável em termos técnicos e econômicos.
“A única possibilidade seria a Vale utilizar o Porto Central para exportação de minério, mas a mineradora já sinaliza sua preferência pelo Açu, inclusive defendendo que a ferrovia EF-118 seja conectada diretamente ao porto fluminense”, afirma.
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Descrença política e crítica pesada
O descrédito não parte apenas dos especialistas. O presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, deputado Marcelo Santos (União Brasil/PP), ecoou a frustração em entrevista à Rádio Litorânea FM, de Marataízes:
“Veja bem o que acontece no Congresso Nacional: o que Brasília produz pra gente? Nada! É só briga e quem paga a conta é o povo”, disparou o parlamentar, que também cravou: “Essa ferrovia [EF-118] não saiu do papel e não vai sair.”
A fala repercutiu em tom de divisor político, ao atingir diretamente o vice-governador Ricardo Ferraço (MDB), pré-candidato ao Palácio Anchieta em 2026, que defende o projeto.
Ferrovia estratégica ou miragem?
A ferrovia EF-118 é considerada peça-chave para o desenvolvimento do Porto Central. Prevista para ligar Santa Leopoldina (ES) a Nova Iguaçu (RJ), com 575 km de extensão, a obra está travada. A Vale se comprometeu com os 80 km iniciais como contrapartida pela renovação da Estrada de Ferro Vitória-Minas, mas até hoje nada saiu do papel.
O restante do traçado depende de estudos, financiamento, reequilíbrio contratual e definição da bitola ferroviária, tornando o projeto cada vez mais distante de se concretizar.
Porto Central: promessa ou miragem?
Com a consolidação do Porto do Açu e a paralisia da EF-118, o cenário é de desânimo. A classe política local já demonstra baixa confiança na viabilidade logística do Porto Central, enquanto a população do sul capixaba assiste à estagnação de um projeto que prometia gerar empregos e alavancar o desenvolvimento da região.
Para Hevilmar Rangel, o Porto Central nunca cumprirá o papel que foi prometido. “Será, no máximo, um terminal de uso restrito, caso a Vale queira utilizá-lo. Mas não se sustentará como hub logístico regional.”
O especialista também alerta para um ponto crucial: a baixa absorção de mão de obra pelo modelo de porto mecanizado. “É capital intensivo, não trabalho intensivo”, explica.
A consolidação do Porto do Açu não enterra apenas o Porto Central. Também inviabiliza o Porto do Barreto, em Macaé (RJ). Segundo Rangel, o município fluminense não tem área de expansão terrestre para abrigar um porto de 5ª geração, tampouco um distrito industrial.
Em paralelo, o mercado imobiliário de Campos dos Goytacazes tende a se desvalorizar, uma vez que as áreas de apoio logístico e industrial seguem concentradas dentro do Açu, que opera como uma cidade-portuária autônoma e integrada.
O que se prometeu como um marco para o Espírito Santo hoje se resume a uma área deserta e sem perspectiva de avanço. O Porto Central virou sinônimo de frustração, e a inércia política, somada à competitividade do Porto do Açu, sepulta de vez um projeto que nasceu grande, mas pode morrer no esquecimento.
*Da Agência Fonte Exclusiva. Compartilhe esta reportagem do Giro Capixaba, o melhor site de notícias do Estado Espírito Santo.
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