Um novo medicamento experimental desenvolvido por pesquisadores do Institut Pasteur de Montevidéu, em parceria com instituições brasileiras, pode representar um avanço inédito no combate à obesidade. Batizado de SANA (salicylate-based nitroalkene), o fármaco ativa a termogênese – processo de produção de calor que consome energia – especificamente nas células do tecido adiposo, sem afetar o sistema nervoso central ou o apetite.
Publicado na revista científica Nature Metabolism, o estudo mostra que, em testes com animais, SANA foi capaz de prevenir o acúmulo de gordura em dietas hiperlipídicas e reverter a obesidade já instalada, inclusive com melhora significativa da resistência à insulina e redução da gordura hepática.
De acordo com Carlos Escande, coordenador da pesquisa, os ensaios clínicos de fase 1 demonstraram que o composto é seguro e bem tolerado em humanos, com indícios de melhora na glicemia e redução de peso em voluntários obesos. “Agora avançamos para a fase 2, que será voltada para testar a eficácia do tratamento em escala maior”, declarou.
O medicamento é derivado do salicilato, substância conhecida por suas propriedades anti-inflamatórias e base de medicamentos como a aspirina. Os cientistas buscavam inicialmente uma droga com efeito anti-inflamatório, mas descobriram, de forma inesperada, a ação potente contra a obesidade.
Em dois modelos experimentais com camundongos, SANA demonstrou alta eficácia
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No grupo preventivo, evitou totalmente o ganho de peso durante oito semanas de dieta gordurosa;
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No grupo já obeso, reduziu 20% da massa corporal em apenas três semanas, além de normalizar indicadores metabólicos.
Segundo William Festuccia (USP), o SANA ativa a termogênese por meio do chamado ciclo fútil da creatina, mecanismo que consome ATP e dissipa energia como calor. A grande inovação é que o processo ocorre independentemente da proteína UCP1, comumente envolvida na termogênese clássica.
“A substância atua apenas nas mitocôndrias do tecido adiposo, sem causar sobrecarga no sistema cardiovascular, como faziam antigos termogênicos”, explica Festuccia. Isso torna o medicamento mais seguro e com menor risco de efeitos colaterais graves.
Outro destaque é a possibilidade de combinar o SANA com drogas já existentes, como os análogos de GLP-1 (ex: semaglutida), que reduzem o apetite. Essa associação poderia superar o chamado efeito platô, comum em tratamentos que apenas limitam a ingestão calórica.
O estudo envolveu cientistas da Unicamp, USP e UFRJ, com apoio da Fapesp. Para Marcelo Mori, da Unicamp, o desenvolvimento de novas estratégias que aumentem o gasto energético é essencial no tratamento moderno da obesidade. “É uma molécula com ação única e potencial de transformar a forma como tratamos distúrbios metabólicos”, conclui.
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